3 de abril de 2012

Simplesmente Tita - Cap 52 - Cricri! (3ª TEMPORADA)




-O que podemos fazer é tentar entrar em acordo com Cássia. – sugeriu uma pedagoga

-Eu não quero acordo. Quero que ela pague pelo que fez.

-Sem provas é inútil acusar alguém.

-Viram o quarto do modo como estava? – exaltei-me – Todos os meus pertences foram extraviados. Nem roupa tenho para os próximos dias.

Cássia foi encontrada por Naná dançando alegremente na festa do pijama. Foi convocada a esclarecer os últimos incidentes e sentia o riso querer sair por entre aquela maledicente língua a proferir todas as palavras torpes que já arruinaram pelo menos 5 anos de minha vida.

-Tita está exagerando.

-Exagerando?

-Você lembra-se do que fez comigo?

-Você me acordou aos chutes porque não achou seu diário.

-Na frente dos adultos você sempre mente, Cássia. Por que tem tanta aversão a mim? O que te fiz para que me provoque tanto?

Diante dos mais velhos, Cássia me abraçava como se tivesse por mim algum tipo de afeto e sob a vigia deles no outro dia até entrei na piscina.

-Tita é uma boba mesmo. Nós a amamos tanto. Não sei por que ela se esconde tanto. – Cássia até afagava minha cabeça e tirava minha canga – Nada de esconder esse corpinho aí, guria. Tão linda usando canga.

-Meninas são tão complicadas. – suspirou o professor de Biologia

A paz durou até que o último adulto se retirasse. Havia algo premeditado. Todos se afastaram da piscina mesmo que as condições climáticas augurassem altas brincadeiras tanto ali quanto na praia. Acabei mergulhando sozinha, tentando acreditar que com a intervenção dos docentes, Cássia iria parar de me amolar e foi então que vi aquela coisa nojenta boiando e todos rindo em volta da piscina.

-Que nojenta! Cagou dentro da piscina. – Cássia colocava as mãos na barriga para rir


-Por isso mesmo não sai daí. – outra menina ria

Os meninos, então, debochavam, atiravam boias e pranchas de plástico em minha direção. Sabia que não tinha feito aquilo. Cássia era capaz. Ainda assim, evacuaram a piscina e fomos proibidos de nela entrar até o fim da viagem.

Humilhada, voltei a procurar Eneida e telefonei a minha mãe. Não permaneceria naquela droga de hotel fazenda nem mais por um dia.

-Tem certeza de que não está inventando coisas, Renata?

-Não, mãe. Eu não aguento mais.

-Vai ter que aguentar. Eu não saio daqui pra te buscar e também não dou um centavo pra você voltar de ônibus. Aguente firme isso aí que logo param.

-Já fazem isso desde 1ª série. Nunca vão parar.

Meire teve a petulância de desligar o telefone na minha cara. Devolvi o aparelho a Eneida e a caseira continuava imóvel, descrente da indiferença de minha mãe.

-Ela é sua mãe mesmo?

-É... – concordei com a cabeça

-Que relação é essa?

-Eu sei lá... Tem sido assim desde que nasci. Ela nunca foi legal comigo.

-Não diga coisas das quais pode querer voltar atrás.

-Não mora lá em casa. Não sabe de nada.

-E seu pai?

Não falava pessoalmente com meu pai desde 1999. A última vez em que conversamos foi quando ele me enganou e nunca mais. Todo aniversário, por mais que o odiasse, aguardava um telefonema, uma visita, até mesmo um sinal de fumaça. A vida era uma eterna iconoclasta.

Eneida era ruiva, um pouco sardenta, estatura média e magra apesar de ter dois filhos com idades entre 2 e 6 anos. A primeira impressão era de uma mulher rude e introvertida, porém revelou-se uma grande amiga e juntas assistimos a novelas, filmes e tive passe livre para entrar no cercado onde eram criados lindos filhotes de cães com porte pequeno a exemplo de Pinscher, Beagle, Yorkshire, Shih-Tzu.

-São lindos, não são? – comentava Eneida colocando ração para a enorme ninhada de Beagles

-São sim. Se eu tivesse dinheiro e minha mãe deixasse, levava um.

-Escolhe um.

-Não posso. Minha mãe não deixa.

-Escolhe.

-Eu ainda vou de ônibus. Não vão o deixar entrar.

-Eu falo com os adultos.

Ele era o menorzinho da ninhada e seus irmãos maiores não o deixavam mamar. Embora triste, abanou o rabinho quando fique de cócoras e afaguei-lhe separada pela cerca. Temia a reação da cachorrinha amamentando.

-Esse aqui já é de alguém?

-Gostou dele? – perguntou Eneida o colocando no colo

-Gostei. – sorri

-Então ele é seu. – me deixou segurar o cãozinho – Ele é meio cricri, mas é um doce.

-Acho que vou chama-lo de Cricri.

Aos cuidados de Eneida e Ademir consegui suportar a estadia no Hotel Fazenda dos infernos e até ousei a andar a cavalo, alimentar as galinhas e curtir os primeiros dias com meu primeiro cachorrinho, sapeca e brincalhão como todo filhote.

De volta a Curitiba, a coordenação do colégio invitou mamãe a comparecer a instituição para ter uma conversa a portas fechadas. Eu, do lado de fora, pude ouvir um pouco do diálogo.

-Desde que a menina Aline morreu, Renata isolou-se muito dos colegas.

-Renata nunca teve nenhum amigo. – Meire afirmava como se fosse sua propriedade

Aline e Adolfo eram meus únicos amigos e deles separada fui sem qualquer chance de impedimento. Antes e depois deles ir a escola era um exercício de garra e resistência.

-A garota pode ter desvios homossexuais. Todos os colegas a acusam disso. – caluniava uma coordenadora – Ela tentou assediar uma professora casada para ser aprovada, segundo os relatos da aluna Cássia, sempre preocupada com Renata
.
Difamações que faziam Meire me tratar com mais rancor ainda. 

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