-A Tita me bateu, professora. – Cássia gritou me empurrando contra o quadro-negro
-PORQUE VOCÊ PROVOCOU.
-E VOCÊ FAÇA O FAVOR DE CALAR A BOCA, SUA MAU CARÁTER. – gritou a velha dos infernos
-OLHA COMO VOCÊ DEIXOU O ROSTO DA CÁSSIA, SUA VADIA. – Erick me empurrou – QUER BRIGAR?VEM ME ENCARAR ENTÃO...
-NÃO MEXE COM A TITA, SEU FILHO DA PUTA.
Adolfo, desesperado, tentou socar Erick que pulou para o outro lado. Certeiramente o murro de Adolfo acertou a boca de Cássia, fazendo com que ela perdesse dois dentes.
A velhota se desesperou e nós, mesmo sem qualquer justificativa que nos defendesse, ainda assim nos acastelamos.
-Professora, a senhora não viu o que ela fez com a Tita? – Adolfo interveio
-Eu vi o que bastava.
Cássia, através da leitura labial, me xingava de manchadinha e fazia gestos obscenos do tipo: você se ferrou, se ferrou, otária.
-Adolfo, Erick, Renata e Cássia, já pra direção.
-Vocês não viram que essas meninas estavam me provocando?
-Eu não vi nada, mocinha. Só a vi perder a razão.
-Elas estão me provocando a manhã toda. – protestei
-Não interessa. Já pra direção.
-Isso não é justo. – comecei a chorar e aí que Cássia e seu exército de piranhas riram mais ainda
-Sem choro. Você está atrapalhando minha aula e se sair, mocinha, não entra mais e vai levar falta, ouviu bem?
Aline foi impedida de entrar e resolveu comparecer até a direção para esclarecer tudo à diretora, já tendenciada a defender Cássia.
-Nossa escola não tolera esse tipo de selvageria.
-Ao menos a senhora ouviu meu lado ou vai proteger a Cássia?
-Cássia não lhe provocou coisíssima nenhuma.
-Então não sei o que ela fez. – Adolfo estava com a face avermelhada e cerrando os punhos
-E não se interrompe uma autoridade, moleque mal educado. Eu estou com a palavra, portanto, cale a boca se não quiser ser expulso.
Nossos pais foram chamados, ou melhor, minha mãe e os pais de Adolfo, pois ambos fomos suspensos por mau comportamento, perturbação da ordem e agressão física. Cássia e seus amigos nos provocaram pela janela.
Ao voltar para a sala de aula só encontramos Aline chorando sozinha na sala e dizendo que iria sair da escola. Nossas mochilas estavam abertas em contato com uma poça de lama remanescente da chuva do dia anterior. Extraviaram nossos materiais, incluindo meu diário, para variar.
-Essa Cássia é filha do diabo. – reclamei aos prantos – Por que ela faz isso?
-Corrigindo: Cássia é o próprio diabo. – Adolfo disse – Mas ela não perde por esperar!
-Já chega de confusão, Adolfo.
-ÓTIMO!ENTÃO QUER QUE ELA CONTINUE HUMILHANDO A GENTE?
-POR QUE TA GRITANDO COMIGO? – o empurrei – VOCÊ É UM IDIOTA!
-Como se eu já não soubesse disso. – ele falou baixinho, sem olhar em meus olhos
-Se você é, eu sou também. – me retratei
-Você não é idiota. Só tentou se fazer notar.
-Desde a 1ª série eu tento, mas parece que nunca ninguém vê o meu lado. Ela arma tudo direitinho pra gente se ferrar. Ela é, como dizem, engenhosa.
-Ela tem o sangue do diabo percorrendo pelas veias. Odeio aquele olhar de víbora.
Sentados no gramado, nós dois choramos. Além de sermos odiados pela classe toda, cruelmente humilhados, nos exaltamos, perdemos a razão, fomos suspensos por alguns dias e ainda por cima nossos pais teriam de custear o implante dentário da cadela da Cássia, mesmo que a própria tivesse plano odontológico. Ou era isso ou iríamos parar no Conselho Tutelar.
-Não olha pra mim, Tita.
-Deixa pra lá, chorão.
-Não me chame assim.
-Então pare de chorar.
-Você também ta chorando.
-Não to. Só to com raiva.
-Tua mãe vai te bater muito?
-Você acha que eu fugi com você por quê?
-Meu padrasto me bate com palavras. Dói do mesmo jeito.
-Vocês nunca se entenderam?
-Por mim ele que se foda, Tita. Minha mãe o ama, ta enfeitiçada e acha que ele é um deus, mas na real ele é um filho da puta que se faz de gente boa na frente dela e quando está a sós comigo me renega, me despreza, mostra quem realmente é. Tua mãe me parece ser assim.
-Ela me culpa por não ter sido o que queria realmente ser.
-Então que não tivesse filho.
-Ela não gosta de mim. – desabei – Eu sinto isso...
-E teu pai? – ele se aproximou e parecia tímido por querer acariciar minhas mãos
-Não fala dessa desgraça. – me esquivei com raiva de querer que ele se aproximasse
-Teu pai também? – bufou indignado - Ai, credo.
-Meu pai me enganou.
-Enganou como?
-Você não entenderia.
-Eu o achei tão legal.
Meu pai era legal. Eu ainda o amava e não gostava de relembrar o verão porque tentar odiá-lo só me fazia quere-lo mais ainda por perto. Adolfo devia me compreender, pois quando me abraçou, o fez com sentimento, o que é complicado para um garoto, sobretudo na idade difícil em que estávamos.
-Sabia que você é minha melhor amiga? – cochichou
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