-Adolfo?
-Estudo nessa merda desde o pré. Não sei se estávamos falando da mesma escola.
-Bem... – desabei na frente do garoto, que papelão – Eu também!
-Também? Mas...
-Eu tive de voltar... Bem, não dá pra falar... Preciso ir.
Adolfo puxou de leve meus braços e me fez lavar o rosto novamente até recobrar totalmente a calma. Toda paciência seria pouco para suportar os longos anos até o 3º do Ensino Médio, provavelmente 2004, se não reprovássemos.
-Não pode aparecer assim na sala. Se a Cássia te ver chorando vai te tirar o ano todo.
-Que se dane ela! Mando meus amigos baterem nela.
-Você é engraçada!
Agora eu entendia por que Adolfo queria tanto que explodissem a escola. Saímos juntos do banheiro.
-Conhece a Cássia?
-Não se lembra de mim?
-Eu era tua vizinha na praia, mas...
-Eu era um gordinho que todo mundo chutava na 1ª série. Não lembra? Pandorga, almôndega, balofo... Eu me lembro de você, uma menininha bem miudinha e inteligente que sentava lá na frente. Eles pegavam pesado.
- Também me chutavam na 1ª série. Inclusive os grandões.
-Quando eu te vi na praia senti que te conhecia de algum lugar e depois de muito me esforçar, lembrei.
-Acho que me condicionei a esquecer certas coisas.
-Está na 6ª A, certo? Se estiver, serei seu colega.
Quando chegamos ao nosso andar, antes que entrássemos em nossa classe, com Cássia piranha, suas amiguinhas e os mesmos idiotas do primário, Adolfo parou a minha frente e disse:
-Tita, antes de a gente entrar, você tem que me prometer uma coisa...
-Não pode ser muito difícil.
-É difícil, mas o único caminho.
-Lá vem bomba... –chiei
-Você tem que prometer que não vai chorar. Ta, eu sei que é difícil, mas se a gente chorar vai ser pior porque vamos ser zoados mais ainda.
-Fala isso como se fosse a coisa mais simples do mundo.
-Sei que não é.
-Você é muito mais bonita que a Cássia, tem potencial pra ser melhor que ela, mas não pode chorar. Isso é troféu pra ela.
Ele já estava indo um pouco longe demais com seu último comentário. Nenhum garoto de 12 anos do mundo concordaria com Adolfo. Cássia era a menina mais perfeita que havia conhecido. O que tinha de bela tinha de má.
Não havia tempo para conversas, portanto entramos, já sendo vaiados por estarmos atrasados.
-Já começaram com o pé esquerdo. – pigarreou a professora parada em frente sua carteira
Literalmente. Atolei meu allstar vermelho numa poça de lama em frente ao colégio, reencontrei a vaca que me provocou o primário todo e ao invés da doce Daniela, a professora de português parecia uma velha paroquiana mal vestida e cheirando a naftalina. Sem paciência nem didática. 50 minutos de tortura. Só conseguia pensar na sorte de Aline, até vê-la entrando em nossa sala.
-Outra? – resmungou a velha
-Desculpa, professora. Problemas técnicos.
-Vá sentar.
2 aulas seguidas com aquela professora chata. O apelido dela era Nana (naftalina).
-A aula da Naná é um porre, então se você quiser ir bem na matéria dela, precisa estudar por conta. – alertou Adolfo, mascando chicletes pra não dormir
-To vendo... – suspirou Aline
-Mas me conta, Aline: o que ta fazendo aqui? – perguntei, fingindo estar anotando uns tópicos sobre análise sintática
-Não soube? Minha mãe foi trabalhar em Matinhos, então meu primo e eu estamos morando com uma tia até mamãe ser transferida pra cá e ela mora mais ou menos perto daqui, então precisei sair de lá. – contou Aline – Mas estou feliz... Se lembra do Mauro? Então, eu não gosto mais dele, mas somos amigos e ele tem um amigo e o amigo dele ficou afim de mim, aí eu to enrolando, mas vou ficar com ele...
Ouvir as historinhas da Aline era bem melhor que aguentar a aula da velha Naná, Gagá, sei lá. Ela era uma chata e a prof Daniela podia sim ter seus 24 anos, mas dominava a Língua Portuguesa bem melhor que aquela velhota esclerosada. Assim começava um ano letivo nem um pouco interessante.
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