-Como assim meu pai não vem me buscar? Ele me prometeu!
-E esqueceu!
-Meu pai é um homem honesto e jamais mentiria pra mim.
-É o que você pensa, querida. Seu pai não é esse santo aí que você coloca num pedestal. Eu diria que ele vacilou bastante em te enganar, não acha?
-Ele não fez isso.
- Fez sim. Melhor que aceite.
-Isso não pode estar acontecendo. – meu mundo desabou
-Pois aconteceu, queridinha.
-Você o afugentou como fez com a mãe da Mari aquela vez.
-Eu? Eu não fiz nada. Foi seu pai quem fez.
-Não acredito. – ela teria de me confessar o que aprontou
-Deveria. – satânica – Papai não vem mais te buscar. Te deixou esperando, que peninha. Percebi que já tinha arrumado as malinhas pra vazar daqui, não? E ele te decepcionou. Sem palavras. – cínica – Sua sorte é que eu sou benevolente e não te expulso daqui porque sei que não tem idade pra isso, muito menos competência pra se virar sozinha, mas não pense que faço questão de tê-la por aqui porque não faço.
Tentei apanhar o telefone para esclarecer o mal entendido, mas mamãe, com violência, arrancou a tomada de modo que até o interruptor veio junto. Saí correndo, mas ela puxou meu braço com força e me empurrou contra a parede. Com o impacto, bati a cabeça e desacordada fui surrada até urinar e sentir minhas costas em carne viva. Odiava duplamente meu pai. Me fez sofrer novamente.
-Antes de ir, uma notícia para nossa rebeldinha de plantão: as aulas começam amanhã e você já está matriculada no novo colégio.
Ainda zonza, precisava tomar um banho e me recompor, ou melhor, chorar tudo que tivesse para chorar. De qualquer forma, fugiria no dia seguinte. As malas ainda estavam prontas e eu tinha alguns trocados.
Primeiro dia de aula com chuvas torrenciais, estridentes berros da minha mãe e a visão do inferno.
-Esse ano só quero notas acima de 8. Um 7,9 e eu te surro pelada debaixo do chuveiro quente, sua vagabunda imprestável. Agora desce e faça o favor de não me fazer precisar pisar aqui sem ser para buscar os boletins com as notas perfeitas.
Desci do carro querendo lhe fazer um gesto obsceno. Mentalmente a xingava de todos os palavrões que conhecia.
Com minha capa de chuva, logo já fui zoada pelos meninos porque pisei em uma poça de água. Para completar, minha mãe berrou de dentro do carro:
-Ê DESASTRADA...
E buzinou única e exclusivamente para me deixar embaraçada diante dos meus novos velhos colegas. Entrei na escola como se estivesse sendo presa. De certa forma, o diabo sorria; eu estava no inferno novamente.
Tão logo reconheci as malditas vadias que me humilhavam no primário. Cássia, a líder, foi a menina mais linda do primário e continuava sendo. Sempre rodeada de três bajuladoras não tão bonitas assim, mas que iam de carona nos rótulos de Cássia, a maior cadela mirim de todos os tempos. Ao me ver, sorriu maliciosamente, fez um comentário com as amigas e todas começaram a rir apontando na minha direção. E no ano anterior eu achava que a Rafa, pobre coitada, era uma patricinha.
Estudaria na sala 6, 2º andar, bloco 2. Ao rever a mesma professora do primário, não segurei o choro e saí correndo para um banheiro. Apressada, entrei na 1ª cabine e tentei me acalmar, o que me fez chorar mais ainda pensando no ano anterior e na saudade que precisaria suprimir a partir dali. Minutos depois, quando tocou o 1º sinal, fui lavar o rosto e levei um susto: era o banheiro dos meninos.
-Tita?

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