Emboscada!
Suja como estava, precisei ir embora o mais depressa possível e nem assim tive paz, pois Márcio e Paloma me cercaram, furtaram minha mochila e começaram a brincar de batata-quente com ela. Quanto mais eu tentava alcança-los e gentilmente pedir para que parassem, eles fugiam e então só depois de alguns minutos consegui recuperar meus pertences e voltar para casa.
-Andou passeando pela favela? – debochou mamãe ao ver meu uniforme em estado inconcebível
-Não enche, velha. – resquícios de Van ainda permaneciam
-Olha o respeito. – Meire me puxou pelo braço e eu a repeli – É melhor que vá já pra esse banho. Sua sorte, se assim considero, é que no antigo colégio não há vagas, senão você voltaria para lá hoje mesmo.
-Quero ver você me obrigar.
Teria conteúdo para completar o diário e só mesmo quando abri a mochila, a surpresa: ele não estava ali!
No outro dia, quando retornei ao colégio usando casaco preto, jeans claro e uma cacharrel no mesmo tom da calça, me encontrei com os metaleiros em frente a porta da sala de biologia. Nesta instituição os alunos vão até o professor.
- Todo ano tem pelo menos uma morte no C.E.P.E.M.. Não é mesmo, meninos? As estatísticas não mentem... – Leitão, um metaleiro gordo e barbudo, foi direto ao assunto
MORTE?
- Não assusta a menina, cara. Não vê que ela ta morrendo de medo? – repreendeu Gui me abraçando e beijando minha testa
- É recomendável que você saia do colégio. Infelizmente, a Van dita as regras aqui. Desde que me entendo por gente é assim e tão cedo as coisas não irão mudar.
Se ficasse, morreria. Se saísse, seria descoberta.
Vanessa, ao subir as escadas, gritou ao me ver e me abraçou como se ainda fossemos as amigas da semana anterior, o que me fez passar aquele dia completamente em paz a ponto de ir conversar com as meninas e pedir ajuda para encontrar meu diário.
Gui e eu estávamos namorando e até pensando numa segunda vez, já que passaríamos a tarde fria juntinhos no quarto dele. Até que coloquei os pés para fora do portão e foram tantos os chutes e socos vindos de diversas direções que nem sequer tive tempo de escapar, respirar ou até mesmo gritar. Emboscada!
Quando recobrei a consciência estava deitada no barraco onde Patrícia morava com o padrasto alcoólatra e a avó aposentada. Paty tomou minhas dores e entrou na briga.
-Odeio aquela baleia exibida da Vanessa.
-Eu já te disse pra não se meter em briga, Patrícia. Ainda mais com essa tal de Vanessa que tem amizade com gente que não presta. – retrucou Severina, uma senhora negra, gordinha, já com feições de avó
-Fica fria, vó. Vanessa é cão que ladra e não morde.
Vanessa armou uma emboscada para me afugentar contando com a ajuda de seus amigos da favela e lá da classe mesmo, incluindo Cristina, Paloma e Márcio. Se Patrícia e Guilherme não interviessem, eu morreria.
Guilherme estava sentado ao meu lado segurando em minha mão, a beijando e recomendando que fosse ao pronto-socorro. Ricardo também estava conosco.
-Eu salvei a Tita dando duas bofetadas numas tchutchucas Com o impacto as minas até caíram no chão. – Kiko e suas vantagens mentirosas
-Bofetada, Kiko? Largue a mão de ser mentiroso! Você levou uma coça das tchutchucas, cara. Ta querendo enganar a quem? – Paty cortou o barato dele
Meu rosto estava irreconhecível. Se Meire visse aquilo, me mandaria para um internato, sei lá. Dormi na casa de Guilherme e transamos pela 2ª vez, o que me ajudou a aliviar um pouco a tensão, esta, que agravou-se na segunda-feira quando nossa classe dividiu em 3 grandes blocos: QG Van, QG Tita e os MDM (Meio do Muro).
Do QG Van faziam parte a líder Van e o vice Márcio, Paloma, Cristina e mais alguns manos. Ao QG Tita integravam Guilherme, os metaleiros em massa, Patrícia, Ricardo e, claro eu. O restante se situava entre MDM com leves tendências a apoiar um dos dois grupos.
As provocações continuavam ocorrendo pelas entrelinhas com os pombos correios MDM mediando as ameaças e naquele fim de aula quem levou uma surra foi Márcio, liquidado pelos golpes de Guilherme e seus amigos, sobretudo porque Márcio me espancou na sexta-feira e iria passar com o carro em cima de mim se não fosse Raimunda estranhar a movimentação e encerrar a briga.
-Homem que bate em mulher é surrado como homem. Não concordam, garotos? – berrou Gui colocando os pés de coturno na barriga do oponente
Mas o cenário de horror se consolidaria no dia seguinte...
Nenhum comentário:
Postar um comentário