23 de janeiro de 2012

Simplesmente Tita - Cap 9 - Dilemas pré-aborrescentes...


-Foi com língua e tudo.

-Que máximo! – os olhos de Mari Franco brilhavam

-Namorei com ele 3 meses, mas terminamos.

Namorado? Aos 11 anos de idade?

-Ei Tita, ouviu essa? A Aline ta de rolo com um piá... – Mari Oliveira avisou

E eu com isso?

Ao contrário de mim, a Aline já era bem extrovertida e nem BV era mais. Já tinha se apaixonado, namorado e adorava boy bands. As meninas passaram a adorá-la e eu acabei ficando de lado, o que me fez ter raiva da Aline. Ela tornou-se o centro das atenções e monopolizava as conversas. Eu até adorava quando ela faltava aula, mas era um saco ouvir as meninas pagando pau pra ela mesmo assim.

-Ai, hoje a Aline disse que ia atrás do Juquinha, o ex dela. Ele ligou ontem dizendo que ainda a ama e quer reatar.

Que dramalhão pra quem estava com apenas 11 anos de idade.

-Ela disse que bem no fundo o que eles viveram foi muito intenso e ela não vai esquecer nunca. Até música ele dedicou a ela na rádio. Todo mundo ouviu.

A Mari Franco tornou-se fã da Aline. Aline pra lá, Aline pra cá. Acho que se a cada vez que MF falasse de Aline ganhasse um real, ao fim do dia seria a pré-aborrescente mais rica do Brasil.

Eu, em vão, tentava chamar atenção.

-Sabia que hoje ganhei 12 reais no caça-níquel?

-Ainda com isso? – Mari Franco fez pouco caso

-Pensei que podia comprar lanche pra vocês.

-Nem me fale em lanche. To de dieta pra perder 3kg pro aniversário do Ju, um gatinho que estou ficando. – Aline me cortou

Dieta?Ficar?Como isso?

Aline já era magrela e tinha orelha furada, usava maquiagem, só falava em meninos o dia todo. Estudar, que é bom, neca. Eu que me lascasse prestando atenção e copiando tudo pras ingratas.

Logo a Mari Franco viajou pro interior pra passar uns dias com os tios e voltou suspirando de amor por um menino que conheceu por lá, com quem perdeu o BV.

-Acho que to apaixonada...

-Mas credo, você mal conheceu o menino e já ficou. - retruquei

-Acorda, né, Tita. Eu tenho 11 anos e já sou uma mulher.

-Ah sim, mulher aos 11.

-Melhor que ser criancinha que nem você.

-Não sou criancinha.

-Ai, não judia da criancinha não. – debochava a Mari Oliveira – Coitada... Ainda nem sabe de nada...

Comecei a me sentir uma aberração quando todas, com suas agendinhas cheias de clips, começaram a falar em dialetos, como se eu não pudesse saber de nada. Estava sendo inconveniente?

Até a Aline chegar ao nosso colégio, eu não estava nem aí com nada e de repente comecei a me sentir ridícula, chata, ultrapassada, ah, e feia também.

Ela, evidentemente, era muito mais interessante que eu. Os meninos também pensavam assim. Era tão chato ver os garotos se aproximando e a história era sempre a mesma:

-Fala de mim pra Aline...

Ou...

-To a fim de ficar com a Aline... Você me ajuda?

Eu era COMPLETAMENTE invisível.

A Aline já usava sutiã, adorava ler as revistas teen, não perdia um capítulo da novelinha da tarde e era apaixonada pelos galãs bombados que nela apareciam.

Eu até ganhei um sutiã no meu aniversário de 10 anos, quando minha mãe viu no noticiário que as meninas estavam menstruando cada vez cedo. Eu lá sabia o que era isso...

Por meses o sutiã rosa bebê com estampa de ursinhos ficou escondido num canto qualquer da minha gaveta, até que notei sua existência e passei a usá-lo, na esperança de parecer mais adulta. Até papel higiênico nos inexistentes seios eu cheguei a usar pra parecer mais velha.

Horácio, meu padrasto, percebeu que eu comecei a me importar com coisas que antes ignorava e sabia que ao chegar em casa eu adorava ver a reprise do Mundo da Lua, depois Chapolin, Chaves, Chiquititas e ouvir música. De repente tentei assistir aquela novelinha que odiava só pra ter assunto e não suportava. Achava tudo muito falso, os diálogos cansativos e mesmo assim as meninas ainda me chamavam de menininha e idolatravam a Aline.

-Não precisa tentar ser o que não é, Tita. Seja você e pronto.

-Você, obviamente, não sabe o que é ser uma mulher de 11 anos.

Até minha mãe arregalou os olhos.

-Mulher?Cadê a mulher que eu não to vendo?

-Eu. – respondi comendo meu macarrão instantâneo de sempre

-Você é muito nova pra pensar em ser mulher. Vá estudar que você ganha bem mais.

Mamãe jamais entenderia como era chato viver à sombra da Aline.

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